A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais incide sobre o tratamento de dados pessoais de pessoas falecidas? Que a LGPD é aplicável às pessoas naturais (físicas), isso não resta dúvida conforme já abordado em artigo publicado por mim neste site (link abaixo). A questão que resta é se a LGPD incide apenas sobre os dados de pessoas vivas ou se também é aplicável após sua morte.
Artigo: A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) aplica-se às pessoas naturais (físicas)?
O art. 1º da LGPD, em seu caput, dispõem sobre quem sua proteção recai que, conforme podemos observar abaixo, é sobre a pessoa natural (física):
Art. 1º Esta Lei dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural. (destaquei)
Sabendo que a LGPD é aplicável às pessoas naturais, vejamos quando encerra a existência desta pessoa em nossa legislação, mais precisamente no art. 6º do Código Civil:
Art. 6º A existência da pessoa natural termina com a morte; presume-se esta, quanto aos ausentes, nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva. (destaquei)
Portanto, a existência da pessoa natural termina com sua morte. Por esta interpretação já poderíamos concluir que a LGPD, portanto, não se aplicaria aos dados das pessoas falecidas uma vez que cessou a existência da pessoa natural sobre a qual a LGPD possui incidência.
Para não restar dúvidas sobre a aplicação da LGPD ao tratamento de dados de pessoas falecidas a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), publicou a Nota Técnica nº 3/2023/CGF/ANPD em que trouxe em sua análise o seguinte entendimento, in verbis:
A LGPD foi editada, conforme disposto em seu art. 1º, para regulamentar o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural.
O art. 5º, V, da LGPD, define o titular de dados pessoais como a pessoa natural a quem se referem os dados pessoais que são objeto de tratamento.
Nesse caso, pressupõe-se que a sua incidência se dá no âmbito do tratamento de dados pessoais de pessoas naturais, ou seja, vivas, já que, de acordo com o art. 6º do Código Civil, a existência da pessoa natural termina com a morte. A proteção post mortem dos direitos da personalidade dos titulares de dados pessoais não estaria, então, abarcada pela LGPD, pois não mais há desenvolvimento de personalidade.
Com o posicionamento da ANPD sobre o tema, a conclusão que se tinha ao analisar o art. 1º da LGPD e o art. 6º do Código Civil foi confirmada. Portanto, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais aplica-se apenas para o tratamento de dados pessoais de pessoas naturais (de forma simples, pessoas físicas enquanto vivas).
Então os dados pessoais de pessoas falecidas estão disponíveis para tratamento irregular? Não é bem assim. O que não incide sobre esses dados são as disposições da LGPD, entretanto, outras legislações vigentes são aplicáveis para garantir a proteção desses dados das pessoas falecidas.
No caso do vazamento de imagens (dados pessoais biométricos) de pessoas mortas em acidentes, por exemplo, pode-se aplicar o Código Penal atribuindo-se o crime de vilipêndio de cadáver (art. 212 do Código Penal), ou, ainda, o Código Civil para buscar reparação por danos morais em razão da violação a um direito da personalidade que permanece protegido mesmo após a morte de seu titular sendo os sucessores legitimados a pleitear a indenização (art. 12, parágrafo único e art. 186 do Código Civil).
Concluindo, os dados pessoais de pessoa morta não são protegidos pela LGPD, porém possuem toda proteção existente nas legislações aplicáveis ao caso.
Espero que este artigo tenha te ajudado a esclarecer eventuais dúvidas em relação ao tema ou a adquirir conhecimento sobre a legislação! Grande abraço!
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